Pessoas conversam em uma obra de instituição pública sobre usos da Estratégia BIM BR
Obras Públicas

Como a vigência da Estratégia BIM BR impacta as instituições públicas

Tempo de leitura: 11 min.

Quais foram as mudanças provocadas pelo Decreto nº 11.888, que institui a Estratégia BIM BR, em relação ao ato administrativo anterior, o Decreto nº 9.983? Essa foi a primeira reflexão trazida pelo professor Ítalo Guedes, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), para os participantes do webinar promovido pela AltoQi sobre a recomendação do uso da Modelagem de Informação da Construção (BIM) em obras públicas. 

Segundo Ítalo, a atualização da Estratégia BIM BR é saudável, considerando o contexto atual do Brasil, em que alguns municípios começam a dar os primeiros passos para contratar serviços de obras públicas em BIM, em respeito, inclusive, à nova lei de licitações. “Essa evolução tecnológica está acontecendo a passos largos e é muito desejável”, afirma. 

Contudo, ainda há falta de conhecimento sobre a Estratégia BIM BR e a metodologia, o que faz com que as pessoas nem saibam por que o BIM pode ser útil. “Muitas instituições públicas ainda estão começando a entender o que é o BIM, ou tem um legado muito grande nas metodologias antigas”, recorda. 

O que é BIM

Diferente do que se pensou durante algum tempo, a metodologia BIM não está relacionada apenas à compra de software. Também envolve processos e pessoas, além da tecnologia. 

O conceito tem sido disseminado desde a década de 1970. Na época, chamava-se Building Description System (BDS). Posteriormente, esse acrônimo sofreu alguns ajustes e passou a ser chamado de Integrated Building Model. Depois, Design Data Model, até começar a ser utilizada a expressão Building Information Modeling (BIM), ou Modelagem de Informação na Construção, em tradução para o português, em meados da década de 1990. 

Em linhas gerais, o BIM é uma metodologia que possibilita a criação de um protótipo virtual da obra, permite inserir nos componentes modelados um banco de dados robusto e, por consequência, gera diversos benefícios para o setor de arquitetura, engenharia e construção (AEC). 

A metodologia é capaz de: 

  • tornar os processos mais produtivos; 
  • agregar mais valor à linha de produção; 
  • gerar menos desperdícios com recursos; 
  • proporcionar maior controle sobre o planejamento de obra; 
  • disponibilizar modelos digitais; 
  • permitir monitoramento em tempo real, vinculando sistemas ao modelo BIM.   

Além disso, o BIM é uma metodologia que possibilita ao setor da arquitetura, engenharia e construção, um dos mais difíceis na transformação digital, a oportunidade de digitalização. 

Desafios da disseminação do BIM

A iniciativa da Estratégia BIM BR nasceu na esfera federal e o Decreto nº 11.888 acaba sendo uma referência para estados e municípios, de acordo com Jordayn Wall, consultor de negócios da AltoQi. Mas a preocupação do especialista é fazer com que os municípios entendam como criar os próprios grupos de estudo sobre BIM e também como utilizar as determinações da legislação federal no contexto da realidade dos municípios. 

Políticas de disseminação do BIM

O professor Ítalo concorda que tão importante quanto os municípios, é os governos estaduais também terem suas políticas de disseminação do BIM para adotar a metodologia. Também afirma que a adoção do BIM vem acontecendo de maneira gradativa e pontual. 

“Alguns municípios já avançaram um pouco mais em relação à aplicação da metodologia, com a publicação de editais de licitações para contratação em BIM, enquanto outros ainda estão capacitando os agentes públicos para entenderem o que é o BIM e quais são as potencialidades de uso da metodologia”, explica. 

Transformação digital do setor produtivo 

Conforme Ítalo, é muito desafiador promover a implementação de uma nova metodologia de trabalho que implique no processo de transformação digital em: 

  • todo o setor produtivo; 
  • todo o setor da arquitetura, engenharia, construção; 
  • todos os agentes envolvidos; 
  • equipes de projetistas; 
  • Contratantes; 
  • proprietários.  

Sendo assim, o professor entende que a transformação só é possível a partir do desenvolvimento de uma visão mais estratégica a nível de região, tendo em vista as peculiaridades regionais do Brasil. “Um grande desafio que vem pela frente é o de tentar compreender melhor como vai se dar essa dinâmica, como serão as relações entre cada nível governamental”, afirma. 

Capacitação profissional em BIM 

Além disso, Ítalo lembra que também é preciso entender o reflexo das publicações normativas nos usuários, ou seja, nos profissionais responsáveis por fazer os projetos em BIM e que precisarão ser capacitados para utilizar a metodologia. 

Disseminar o BIM nos cursos de arquitetura, urbanismo, engenharia civil, para formar os novos profissionais com competências que o mercado está demandando, e vai demandar cada vez mais, é um ponto que requer bastante atenção na percepção do professor, assim como a questão dos indicadores.  

Indicadores da disseminação do BIM 

“Entender como vamos conseguir explorar e monitorar os indicadores de disseminação do BIM de uma forma mais estratégica, considerando as dimensões continentais que o Brasil possui, é outra pergunta que precisamos responder”, destaca o professor Ítalo Guedes, que considera esse mais um grande desafio motivado pela Estratégia BIM BR. 

O professor considera que para promover um planejamento estratégico de monitoramento contínuo é preciso, antes, entender quais são os componentes de maturidade que devem ser monitorados. Dessa forma, sugere às instituições públicas que desenvolvam uma visão sobre o BIM para além da tecnologia. Significa “olhar o BIM entendendo exatamente o conjunto de políticas, processos, tecnologias, pessoas, pois a metodologia depende exclusivamente também de pessoas”, diz. 

Sinergia entre governo, academia e indústria 

Outra questão levantada pelo professor é sobre a impossibilidade de discutir o BIM, em um país com as dimensões continentais do Brasil, sem a interação e interlocução entre governo, academia e indústria.  

É uma aproximação que beneficia não só a implementação do BIM no país, mas que também permite aproveitar os projetos criados pelo governo federal, como o novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que prevê o investimento de R$ 1,7 trilhão em obras no Brasil, e o projeto da Nova Indústria Brasil (NIB), com investimentos de até R$ 300 bilhões até 2026 para melhorar a qualidade de vida nas cidades. 

“São tópicos que estão em outros projetos macros do governo, mas que possuem uma boa convergência com a Estratégia BIM BR, ou seja, com o Decreto nº 11.888”, destaca Ítalo Guedes. “É uma oportunidade para não só discutirmos a teoria do BIM, mas também implementarmos o BIM, monitorar e apresentar os indicadores de ganhos que o BIM possibilita para o nosso setor”. 

Interoperabilidade 

É comum os projetistas utilizarem diferentes plataformas para conceber os projetos em BIM. Com isso, a interoperabilidade é um fator importante para a metodologia. 

O desafio é estabelecer um padrão de formato de dados aberto, neutro, não proprietário, tal como o Industry Foundation Class (IFC), criado pela buildingSMART  e já normatizado pela ISO 19650. “Um padrão que seja útil para os projetistas e ofereça liberdade de escolha quanto aos softwares que irão utilizar”, acrescenta o professor. 

Somado a isso, é importante que o contratante estabeleça os requisitos dos projetos, o padrão de formato de dados para troca de informações entre plataformas, de maneira que o projetista possa desenvolver o modelo digital com base nesses requisitos.  

Benefícios do BIM para as instituições públicas 

Uma barreira a ser transposta, ainda, é a associação do BIM apenas com a etapa de planejamento, concepção e coordenação do projeto. O professor Ítalo Guedes e o consultor Jordayn Wall concordam que o BIM também entrega valor às fases pós-obra, à gestão e à manutenção de ativos, e até mesmo ao retrofit. “Existem empresas que nem sabem o quanto podem se beneficiar com o uso do BIM”, reforça Ìtalo. 

A metodologia é associada à maior: 

O BIM possibilita entregar obras em um prazo mais adequado, eliminando a necessidade de aditivos contratuais de prazo ou até mesmo de aditivos contratuais de ajuste de projeto. 

Passos para implementar o BIM nos órgãos públicos 

A recomendação do professor Ítalo Guedes para gestores públicos de municípios e governos estaduais, e para empresas privadas que queiram implementar o BIM, é entender quais perguntas sobre a metodologia precisam ser respondidas, dentro das suas realidades específicas. “Porque nem sempre uma pergunta da prefeitura de Recife sobre BIM será a mesma pergunta da prefeitura de Florianópolis. Nem sempre o escopo de uma Secretaria de Infraestrutura de um município é o mesmo escopo de uma Secretaria de Infraestrutura de outro município”, exemplifica.  

Dentro da realidade brasileira, há diversos cenários. Portanto, a variação de escopo é muito ampla. Enquanto uma Secretarias de Obras contrata o projeto, a outra contrata apenas a execução da obra. Também tem um terceiro contexto em que a Secretaria elabora o projeto, contrata a obra e faz toda a manutenção e a operação do ativo.  

"O Plano de Implementação BIM deve ser pautado olhando para esse escopo individualmente ao invés de uma visão genérica que limita a instituição e os avanços a médio e longo prazo de adoção da metodologia”, observa o professor. 

O consultor Jordayn Wall concorda que cada instituição, em cada esfera de governo, tem seu nível de desafio. Por isso, entende que a melhor maneira de os governos e seus órgãos públicos implementarem o BIM é a partir da elaboração dos seus próprios decretos e Grupos de Trabalho BIM (GTBIM), com o objetivo de ampliar o conhecimento sobre o tema.  

“A organização não precisa se precipitar, fazendo a aquisição imediata de uma grande infraestrutura tecnológica, sem ao menos saber se tem mão de obra qualificada para tirar proveito dessa infraestrutura que a metodologia possibilita”, aconselha Ítalo. 

Somente depois de haver as normas e ser concluída a etapa de sensibilização e capacitação sobre BIM, é que Jordayn recomenda que seja dado o próximo passo na implementação do BIM, que é entender o legado e planejar a transição para o BIM. “O legado vai existir por muito tempo, então, os métodos de trabalho terão de coexistir até que um realmente consiga substituir o outro”, lembra. 

Dessa forma, a instituição constrói um caminho mais adequado, não apenas olhando o avanço do BIM no órgão do ponto de vista da tecnologia, mas também do ponto de vista de processos, políticas e capacitação pessoal. 

Para acessar mais estratégias para a implementação prática do BIM em projetos públicos, assista no YouTube da AltoQi como foi o processo de adoção do BIM no Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (TRT-SC).