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Especialista dá dicas de como implementar o BIM na prefeitura

Escrito por Claudia De Conto | 12/05/2025 11:00:00

A implementação do BIM (Building Information Modeling) na engenharia pública é um tema cada vez mais relevante. Com isso, diversas prefeituras têm buscado entender e aplicar essa tecnologia, que transforma a maneira como projetos de construção são planejados e executados.  

A prefeitura de Londrina, cidade localizada na região Norte do estado do Paraná, sentiu essa necessidade em 2018, ano em que o governo brasileiro publicou o Decreto nº. 9.377, que instituiu a Estratégia Nacional de Disseminação do BIM. “Quando começamos a realmente estudar o BIM, percebemos que tínhamos de percorrer um caminho muito grande”, afirma o gestor de Engenharia Civil da prefeitura de Londrina, Matheus Borges Chaves. 

Matheus atua na Engenharia Civil e de Segurança do Trabalho há mais de 10 anos e possui experiência em orçamentos e projetos de obras públicas. Também é membro do núcleo BIM-LD de Londrina e conta na entrevista a seguir qual foi a solução para conseguir implementar o BIM na prefeitura. 

O engenheiro revela quais foram os passos dados até a adoção de softwares BIM para projetos de instalações, estrutural e qual é o melhor software para gestão de orçamento de obras. Leia a entrevista na íntegra para descobrir.

Desafios e oportunidades na implementação do BIM em obras públicas 

O que fez a prefeitura de Londrina decidir implementar o BIM? 

Matheus Borges Chaves - Começamos a pensar no BIM, na prefeitura de Londrina, entre 2018 e 2019. A primeira coisa que fizemos foi trazer o professor doutor Sérgio Scheer para fazer uma palestra para os técnicos e mostrar a capacidade do BIM. Até brinco que foi o tipo de palestra que nos faz brilhar os olhos. Com essa palestra, conseguimos entender tudo o que poderia ser feito com a implementação do BIM. Mas quando começamos a realmente estudar a metodologia, entendemos que para chegar naquele nível ainda tínhamos um caminho muito grande para andar. Depois disso, veio a pandemia. 

A pandemia foi um obstáculo na implementação do BIM?

Matheus - Nesse tempo, entre 2020 e 2021, nós não conseguimos avançar muito na implementação. Mas sempre mantivemos as conversas para entender o que íamos fazer para implementar o BIM. Em 2022 já tínhamos a clara noção de que não havia nenhum técnico na prefeitura com conhecimento para implantar o BIM ou assumir essa responsabilidade. 

Como vocês resolveram essa falta de especialistas em BIM na prefeitura?  

 Matheus - Decidimos contratar uma consultoria. Sabíamos de algumas empresas de consultoria e de outras que ofereciam softwares e consultoria, mas os valores eram muito discrepantes. Tínhamos cotações de milhões e de milhares, o que tornava difícil chegar em uma média de valor. Até que tivemos contato com o Senai do Paraná, que prestava esse serviço de consultoria sobre BIM. O que eles nos ofereceram era justamente o que nós estávamos precisando e buscando. Conseguimos fazer a contratação direta, com dispensa de licitação. Evitamos o risco de contratar uma empresa sem conhecimento em BIM ou incapaz de entregar o serviço de acordo com as nossas expectativas. Realizamos 22 meses de consultoria e nesse período licitamos um projeto para que nos ajudassem a acompanhar, fiscalizar e a colocar em prática os conceitos que aprendemos.

Por que a documentação é tão relevante quando se implanta o BIM na prefeitura? 

Matheus – A documentação define o que a prefeitura espera do BIM. Isso é formatado no AIR [Asset Information Requirements], que informa os requisitos de informação da organização, e no EIR [Employer’s Information Requirements], que determina quais são as exigências que a empresa terá de cumprir e de que forma se dará a comunicação com esse fornecedor de obras públicas. De tudo isso, o mais importante é a documentação conter o que será exigido de informação dentro do modelo, pois é o que possibilita automatizar um orçamento, por exemplo.  

Tem muita prefeitura interessada em implantar o BIM e várias empresas oferecendo esse serviço. No que é importante prestar atenção? 

Matheus – Às vezes o município tem um jurídico que não deixa fazer a contratação direta, como fizemos em Londrina. Esses municípios precisam de um termo de referência para fazer a licitação, o pregão, a competição [de preços] e etc, e prestar atenção nas empresas. Perceber se não vai ter um direcionamento para algum software porque há o risco de haver responsabilização sobre isso. Implantar o BIM pensando no software X ou no software Y pode ser muito caro, também. Imaginando um município com 10 engenheiros, em que os 10 irão precisar de licença, quanto isso vai custar? Essa era uma coisa com a qual nos preocupávamos. Em Londrina nós somos quase 50 engenheiros. É um impacto grande de software.

A realidade é diferente em cada prefeitura. Nas menores, é possível implementar o BIM? 

Matheus – Acredito que sim, mas vão implementar um uso BIM menor. Até porque não tem como não implementar. Por isso que considero entender os conceitos BIM e até onde se quer chegar com a metodologia, primordial para os municípios, ainda mais os que têm equipes de engenharia menores ou terceirizadas. Afinal, o BIM é um caminho sem volta e em alguns anos deve ser uma exigência do próprio governo federal para liberar recursos para os municípios. Acredito que nenhum quer correr o risco de perder recursos porque isso também pode causar responsabilização.

Quais são as maiores dificuldades para implantação do BIM em uma prefeitura? 

Matheus – Tempo, dinheiro, questões políticas e cultura interna. No funcionalismo público do Brasil sempre está faltando gente. Por exemplo, eu tinha o meu trabalho normal, que era fazer o orçamento. Não consegui deixar de fazer o orçamento para me dedicar à implementação do BIM. A falta de uma dedicação exclusiva acaba atrapalhando a implementação. Em termos de dinheiro, o exemplo são as máquinas. Na prefeitura de Londrina nós trocamos os computadores em 2020, durante a pandemia. Isso foi um ganho porque o computador anterior não aguentaria os softwares. Já a política é no sentido de que precisamos vender a ideia do BIM para os nossos superiores, fazê-los entender que o investimento traz benefícios. Mas se a equipe técnica não tem proximidade com o prefeito, por exemplo, vai ter que procurar engajar secretários para buscar uma  oportunidade de implementar o BIM da forma correta. Existem pessoas que estão acostumadas a trabalhar de um mesmo jeito, sempre. A mudança de paradigma, a mudança de conceitos, na forma de trabalhar, pode gerar opiniões contrárias capazes de impedirem o avanço do BIM. 

Como tem sido a experiência de Londrina com projetos em BIM? 

Matheus – Londrina é um município que licita muitos projetos. Nós terceirizamos bastante a elaboração de projetos e implantamos o BIM pensando em contratar, em fiscalizar projetos em BIM, não em elaborar projetos. Agora, iniciamos um estudo para entender se temos servidores [públicos], softwares e tudo o mais para começar a elaborar os projetos internamente. 

Qual é a relação custo-benefício em implantar o BIM em um município? 

Matheus – Realmente, o impacto inicial é grande porque, às vezes, é necessário melhorar os computadores, comprar novos equipamentos, fazer a aquisição de softwares. Agora, só o fato de ter o modelo 3D já é um ganho. Poder ver como vai ficar a obra já vale muito a pena. O grande fantasma da obra pública é o aditivo. Em Londrina o nosso objetivo é reduzir os aditivos de obra por erro de projeto.

Qual é o passo a passo para implementar o BIM em uma prefeitura? 

Matheus – O começo de tudo é analisar, olhar para dentro da organização, da secretaria, do órgão e ver o que é que tem de recursos tecnológicos, de recursos humanos e de recursos financeiros disponíveis. Na sequência, é entender até onde vai ser aplicado o BIM e se será necessário usar algum software. Por exemplo, para modelar é preciso ter um software nativo de modelagem. Nesse caso, também é necessário saber quem vai usar esse software para não contratar licenças a mais porque é uma contratação cara. Depois disso, é criar uma documentação, pois o órgão público precisa saber exatamente o que quer. Licitar ou fazer alguma coisa sem ter muito claro o que é esperado tem o risco de, no final, ser entregue qualquer coisa.

Quais são os benefícios do BIM para as obras públicas?  

Matheus – É realmente poder construir virtualmente. Infelizmente temos uma cultura de fazer projeto rápido, fazer orçamento rápido e deixar todos os problemas para serem resolvidos na obra. Mas o BIM obriga a pensar em tudo antes, a fazer o raciocínio de algumas fases antes, porque senão, depois, há muito retrabalho. Esse é um benefício porque o projetista precisa modelar a obra do jeito que ela vai ser. Isso traz confiança, dá o poder de questionar solicitações de aditivo, por exemplo, desde que esteja tudo certo, modelado sem nenhum erro, conforme realmente vai ser o empreendimento. Acredito que esse é um benefício muito bom porque, dependendo da quantidade de ativos, pode ter responsabilização, também. 

Pensando em usos mais avançados, você consegue automatizar um orçamento de obras. 

Qual é a diferença entre fazer um orçamento e projeto com a ajuda de uma ferramenta digital? 

Matheus – Não é fácil fazer orçamento de obra pública. É preciso lembrar de muita coisa, algumas que às vezes nem estão no projeto. O cerne do orçamento de obras públicas é a quantidade. Temos de ser o mais assertivo possível nas quantidades porque é o que as empresas geralmente questionam, apontam que está faltando. O BIM dá a confiabilidade por permitir ter o modelo guardado referenciando todas as informações, o que contribui muito para quando são feitos esses questionamentos. Com isso, não há muito o que questionar acerca de quantidade. Para os orçamentistas é muito bom ter essa confiabilidade. 

Na prefeitura de Londrina utilizamos o AltoQi Visus e não sei se existe uma plataforma igual no Brasil, que faça o que o Visus faz, ou seja, que aceite o arquivo .IFC, extraia as quantidades automaticamente e mostre de onde elas surgiram.  

O Visus tem um recurso que considero sensacional. Basta clicar na linha do orçamento para visualizar de onde estão vindo as informações sobre quantidade. É a esse nível de confiabilidade a que me refiro como orçamentista. Só é preciso entender como é preciso modelar para que o Visus faça o que queremos. Porque se a informação não estiver dentro do objeto, por exemplo, o Visus não vai gerar o quantitativo como desejado. Então, da forma como o software funciona, é preciso exigir mais informação do modelador.  

Apostamos muito na plataforma Visus. O software tem a opção de fazer orçamentos não BIM e possui nativamente algumas outras bases de referência, e não apenas a Sinapi, importantes para termos referências para a composição de custos. 

Implementar o BIM nas obras públicas é uma determinação governamental. Solicite uma consultoria  para ter o mesmo sucesso que a prefeitura de Londrina no uso da metodologia.